sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Requerimento de licença poética

   Desta vez serei educada: peço licença para sair da mesa literária, e voltar em breve. Por quê? Ora, é fim de período lá na UERJ, e todos do curso de Direito estão estudando muito, inclusive esta escritora aqui. Sim, eu sei que havia prometido postar novamente logo, mas eu estou sujeita a mudanças de planos.
   Para os que acham que priorizar a vida concreta (a vida lá fora) em relação às publicações, por um período, é negligenciar a Musa, Ela manda dizer que não é bem assim. Afinal, a Dama está em todo lugar, e mesmo no turbilhão do cotidiano, os escritores a veem. E sempre dão um jeito de encontrar uma caneta e uma folha de papel, e usá-los em raros oásis de ócio...
 Com licença poética,
  Isabela Escher Rebelo. 

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Fotopoesia

 Sei que as eleições mal acabaram, e de novo mudo de assunto da política para o lirismo que não tem a ver com o poder. Os leitores desse blog já sabem, entretanto, que não falo de política só em épocas de eleição, assim como não discuto qualquer assunto só enquanto os gigantes da mídia se ocupam disso. Nesse espírito, prometo em breve postar sobre um tema já quase esquecido pela comunicação em massa, e que envolve interesses políticos também.
  Mas voltemos ao presente. Hoje e aqui o lirismo não estará apenas em palavras. Ofereço a vocês também o lirismo das imagens. Que todos tenham olhos para enxergar a Poesia onde quer que ela esteja!

"Para além da Terra, para além do Infinito,
eu procurava avistar o Céu e o Inferno.




  
                                                         Uma voz solene disse-me:





"O Céu e o Inferno estão dentro de ti.'''


PS: Os belíssimos versos são de Omar Khayyam, poeta persa do século XI, autor de "Rubayat". A tradução é uma variante da que aparece no livro "Solo de clarineta, Memórias I", de Érico Veríssimo, no qual tive meu primeiro contato com Khayyam. As fotos foram tiradas na murada da enseada da Urca por Pedro Amorim. E, nesse ensaio, sendo eu a modelo, virei parte de uma fotopoesia...

domingo, 31 de outubro de 2010

Em busca da salvação

 Todos procuram, de alguma forma, a salvação. Mesmo quem não se encaixa na categoria de religioso fervoroso (como eu) a busca. Como? Aplicando a moral na sua vida. A moral não é matéria exclusiva da religião; aquela precede essa, tendo nascido junto com a própria convivência em grupo na Humanidade. Nesse sentido, a diferença entre os religiosos fervorosos e os que não são reside no fato de que esses se preocupam muito mais em aplicar princípios morais nos quais acreditam pela razão ou emoção do que em seguir de forma estrita e cega ordens supostamente vindas de uma entidade superior.
    Mas esse não é um texto filosófico sobre moral e religião; de novo, abordo a política. Muitos políticos brasileiros parecem ter esquecido completamente a moral em suas vidas públicas, a julgar pelos já bastante conhecidos casos de corrupção e mesmo do fato de negarem ad aeternum a sua culpa. Muitos o fazem. Amém.
     Entretanto, queridos irmãos, a religião só é invocada quando convém no cenário brasileiro atual. Quando vários dos nossos amados governantes praticam a corrupção, especialmente desrespeitando o mandamento cristão "Não furtarás", eles se esquecem de todas as doutrinas cristãs que proíbem tal prática. Mas quando as eleições chegam e uma questão carregada de cunho religioso vem à tona, mais uma vez ela é relembrada por partidos, governantes e candidatos.
      Que coincidência! O que eu escrevi se aplica muito bem a esse segundo turno, presidencial, no qual os dois candidatos dizem ser contra o aborto, a favor da vida e da família, discurso tipicamente religioso, incitado por causa de declarações de que Dilma era a favor do aborto.
      Esta será, infelizmente, a questão que norteará as eleições: quem é verdadeiramente o candidato cristão, Dilma ou Serra? Essa é a pergunta que milhões de católicos, evangélicos e espíritas (obviamente, os fervorosos) se fazem diante da escolha que têm de fazer. Como eu já disse aqui na postagem anterior, para que se preocupar com questões como economia, política externa, desigualdade social, concentração fundiária, direitos sociais? Bobagem...
       Aos nossos queridos iludidos religiosos, eu digo: apenas Deus sabe até que ponto os posicionamentos de certos políticos traduzem suas verdadeiras crenças...
       É revoltante ver uma eleição ser praticamente decidida pela religião, mas é isso que vai acontecer. Cabe aqui elogiar sinceramente Marina Silva, que não usou o púlpito como palanque e que sempre quis preservar o Estado Laico. Não, ela não é atéia, pelo contrário, é evangélica; e assim, prova que a razão e a moral política não são exclusivas dos céticos.
        A grande maldição da tradição política brasileira é a busca do messias. O povo sempre está esperando por apenas um líder que consiga, sozinho, consertar o país. E agora o termo "messias" se torna mais apropriado ainda, em vista do caráter religioso desejado por muitos eleitores em seus governantes.
     O que fazer agora? Só sei que continuo a minha eterna cruzada: buscar a palavra que pode verdadeiramente nos salvar. Deixo aqui um antigo poema meu, mas que vale a pena relembrar:


Revolução


 A palavra destrói os grandes reinados;

por trás de uma gota de sangue, tinta azul há.

A palavra que afaga, que sorri amiga,

é a mesma que pode chicotear.


Da coroa de ouro e de diamantes,

com punhais a palavra há de se armar.

A palavra destrói os grandes reinados;

por trás de uma gota de sangue, tinta azul há.


Escrita em lágrimas ou em sorrisos,

nos olhos, na alma, estática jazerá.

Mas se a transcrevermos numa folha amarelada,

rubros corações há de sangrar.


Espada de luz que nos banha em tormento,

riso febril que traduz sofrimento,

leal traidora a nos circundar.

A palavra que afaga, que sorri amiga,

é a mesma que pode chicotear.



PS: Happy Halloween...

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Vórtices: entre o livro, a cruz e a espada

   Estou de volta. Sim, eu sei que saí sem avisar, e me ausentei por longo tempo, tudo isso devido ao fato de eu ter começado a cursar Direito na UERJ em agosto. Como já disse antes, no poema "Monotonia", eu precisava de um mundo novo para explorar, e devo dizer que o mundo uerjiano me sugou como um vórtice: vários textos interessantes e volumosos para ler, festas, amigos, provas... Mas não desejo me eximir de culpa: eu deveria ter avisado a vocês de que me ausentaria bastante, poucos e bons leitores desse blog. Cogitei mesmo fazer isso, mas terminei por sequer concluir a postagem de requerimento de licença poética pelo mesmo excesso de compromissos e cansaço, que existiu desde o instante em que entrei na UERJ.
   Mas agora voltei. Sei que logo o vórtice universitário me pegará de novo, mas agora que tive a chance de emergir por um breve período dele, vou falar de um outro turbilhão aqui: as eleições brasileiras.
   No primeiro turno, vimos vários candidatos mal articulados, com propostas vagas e utópicas, e não raro encontramos aqueles na prática abertamente corruptos. E agora?
   Agora chegamos ao segundo turno, de caráter exclusivamente presidencial, e ganhamos uma maldita surpresa: as eleições serão decididas pelos evangélicos, espíritas e católicos fervorosos. A controvérsia sobre a posição dos candidatos a respeito do aborto e do casamento gay dominou a cena política. Por quê, Deus? 
   Não é preciso ter uma visão para descobrir a resposta. O Brasil é um país em que a religião tem mais influência política do que na maioria das nações ocidentais. Não sejamos inocentes: em qualquer país do mundo, pareceres religiosos influenciam de alguma forma a política. A religião está enraizada na maior parte dos seres humanos, de tal forma que agem muitas vezes de acordo com ela. Mas essa influência, na maior parte do mundo ocidental, foi bastante reduzida, a ponto de não decidir eleições. O Brasil, mais uma vez, é exceção.
    Será que Dilma quer a legalização do aborto? Será que Serra é o verdadeiro candidato cristão? Infelizmente, essas se tornaram questões fundamentais para as eleições brasileiras. Por que se preocupar com coisas secundárias como distribuição de renda, melhores serviços públicos, políticas econômicas internas e externas? Bobagem! Vamos falar do respeito à vida dos fetos, mas não nos preocupemos com os que já saíram do útero materno e aqui vivem, nesse Brasil...
    Quando eu era criança, ficava entusiasmada com as eleições. Assistia todo o horário eleitoral e chegava a decorar as músicas de campanha de alguns candidatos. Agora que cresci, vejo que praticamente nenhum político brasileiro mereceu essa reação de uma pessoa. Isso vale para o momento atual principalmente. O triste é ver que muitos eleitores não cresceram, são crianças que ainda saem por aí com os olhos brilhando ao divulgarem seu messias. E uma coisa muito lamentável também é ver o nível geral da propaganda política.     
    Como se não bastasse a exposição vaga das propostas de governo (quando elas existem) e o ataque hiperbólico ao adversário, há sempre aqueles slogans ridículos e tentativas lamentáveis de criar empatia com o povo, que ultrapassou a esfera do "Jovem vota em jovem" e alcançou o nível de se contratar cabos e fantasiá-los de caixinhas de leite (estampadas com a foto de um certo candidato cujo sobrenome é Leite) para que eles dancem no sinal. Não preciso citar os nomes dos políticos que se prestaram a isso, os cariocas os conhecem bem...
      O pior é ver que o povo se presta a esse circo. E quanto mais nos afundamos em ignorância e desinteresse político, pior fica. Ao contrário do que disse o famigerado deputado eleito por São Paulo, pode ficar muito pior, sim.  
       Deixo aqui um poema meu, intitulado "Brasil". Apreciem a ironia...
      
Brasil
      
Ó terra dos quentes trópicos,

onde se sepultam sonhos utópicos

e objetivos surreais!

Tu és bela como a brisa marítima,

que faz voar os cabelos das raparigas,

e que sacode as folhas dos coqueirais!



Como um cravo que nasceu do fogo,

como uma estrela feita de ouro,

adejas neste céu anil!

Como um sabiá a cantar,

repousa, lânguido, sobre o mar,

tu és o nosso Brasil!



Ó Brasil tão cantado,

país tão famigerado,

aqui venho louvar-te!

Nos meus versos o homenagearei,

tal qual um grande rei,

que a seus pés venho prostrar-me!



E apesar das colossais impurezas,

possuis tantas belezas,

e virtudes sensacionais!

Brasil meu, és terra dos quentes trópicos,

onde se sepultam sonhos utópicos,

e objetivos surreais!

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Alma romântica

  "Sou romântico? Concedo./Exibo, sem evasiva,/A alma ruim que Deus me deu."
  Esses são os três primeiros versos da segunda estrofe do poema "Sextilhas românticas", escrito pelo excelente Manuel Bandeira. Talvez você, leitor, esteja confuso, pois não era para o bardo ser modernista? Sim, ele é, mas isso não impede que Bandeira tenha recebido influências românticas, como esse e vários outros poemas (entre eles o famosíssimo "Vou-me embora pra Pasárgada" e uma versão de "Belo Belo") lindamente revelam.
  Alguns ainda acham, contrariando a clareza trazida pelo tempo, que o Romantismo brasileiro deve ser desprezado. Não digo que o Romantismo é melhor que o Modernismo, mas certamente aquele nos deu versos belos, e se influenciar textos modernistas ou contemporâneos positivamente, qual é o problema?
  O próprio Mário de Andrade, um dos mais importantes líderes do movimento modernista da primeira geração, ao longo do tempo, reconheceu que deve haver liberdade artística, e que escolas literárias passadas, como o Romantismo, podem sim influenciar o Modernismo com bons resultados.
  É nesse espírito que coloco aqui alguns versos meus que evidenciam a vertente romântica da minha alma. Um abraço para Bandeira e para Andrade!


Olhos vítreos 


Meus olhos são impuros, pois provém da mistura
de elementos diáfanos, translúcidos, surreais,
talvez não impuros, talvez somente sejam
um par de olhos irreais.


 Meus olhos são filhos do ar invernal,
ao mesclar-se com a superfície da água
pura, límpida, gélida, luzidia,
e desses dois com mil lágrimas diáfanas.


Não obstante, diamantes de fogo
teimaram, nesse feitiço, entrar,
tecendo, com desvelo, escassos fios de ouro
que quebram a tundra do meu olhar.


Estrelas de gelo, cometas errantes
perdidos na imensa e larga vastidão
dum Universo paralelo, criado por mim,
ou pelos caprichos do meu coração!


Assim são meus olhos;
como as calotas polares, ninguém irá adivinhar
que pulsa o sangue, explode o magma,
dentro do Vesúvio do meu olhar.


 Tênue coração


Meu coração pulsa doidamente,
febrilmente, ávido de emoção,
como uma criança a correr pela casa,
como o vento que uiva e corta qual uma navalha,
como se fosse uma sina, uma maldição!


Grande sonhador sem rumo certo,
com asas do tamanho do firmamento,
ainda voas pelos mais fascinantes lugares e desertos;
tuas asas não excedem teu sofrimento!


Encontra-se imerso na rubra inquietude,
que se transmite pelo meu olhar, o meu coração!
Uma doce fome pelos sentimentos da vida,
marcada pelo compasso instável de sua alegre pulsação!


Chamam-te tênue porque perdoas a teus inimigos,
não importando quantas vezes ousem te despedaçar!
Sorris calorosamente a desconhecidos,
não pensando que podes vir a agonizar.

Não chamo-te tênue; chamo-te forte,
como é forte um corajoso leão,
pois bravamente suportas o teu tormento,
pois ainda lutas, meu caro coração!


Não te tenho piedade; a misericórdia
é para os que, vencidos, se encontram desesperados;
ainda lutas, embora ensangüentado,
pelo mesmo mundo de que de ti riu!


És nobre e conserva essa nobreza,
como da prata há a eterna pureza,
às vezes alegre, às vezes triste!


És nobre, purpúreo, mas não te rebaixes nem curves
ao mundo que te acusa e que a ti ruge,
que te acusa injustamente com o dedo em riste!


O Poente

A tarde ia-se embora,
levando consigo as rosas,
que o Sol fez desabrochar!
As rosas, agora, eram outras,
no ar estavam soltas,
ao mundo iluminar!



Eram rosas, rubras e belas;
Eram flores, pálidas e singelas,

que, nas trevas, sozinhas, luziam!
E duvido que alguém percebesse, além de mim,
o cântico sem fim,
com que elas nos advertiam:
“Mortais, ouvi com atenção
o seu pobre coração,
para não serem como nós, sofredoras;
vivemos à Eternidade, sim, confessamos,

mas já fomos humanas e cem lágrimas derramamos,
estamos presas e não soltas;
Presas dentro de nós mesmas,
e apesar de sermos estrelas,
preferiríamos ter sido loucas”.


Afinal, esses raros primores
recusaram todos os amores,
que o Destino lhes oferecia;
Por medo, receio ou pânico,
viraram-se em puro pranto,
em estrelas esquivas.

quinta-feira, 29 de julho de 2010

Poesia metalinguística e auto-crítica

  Acordei hoje com um espírito metalinguístico e resolvi reunir aqui alguns belos versos que falam sobre a Musa e o poeta. Convido você, leitor, a comparar dois poemas meus dessa mesma temática: "Sopro de água", que aparece bem no início de "Coração in vitro", e "Bela Balada", os penúltimos versos do meu livro, que inclusive foram postados em fevereiro, mas que orgulhosamente retomo.

 Sopro de água

Minha pena dança sobre o alvor do papel
e nas palavras encontro o meu refúgio;
tirando dos meus olhos todo o pranto,
afogo-me de novo em um mar turvo.

Oh, pobre sofrimento inconstante,
que me mata e me deleita como a uma rainha,
pois, se da dor tiro eu esperanças,
de teu ventre geras alegria!

E somente quem se empenha, de todo,
na graciosa arte de escrever
sabe que o lodo pode ser perfume
ao mesmo tempo, mas a diferente ver.

E esta abundância que explode em minh’alma,
de belas rosas de emoções distintas,
dá-me sempre uma fugaz certeza:
hei de ser eternamente serva e rainha.


Bela Balada

Fazer sentir o vibrar da emoção,
e ser eterno o fugidio lampejo,
perenizar o bater do coração,
iluminar a luz de um triste beijo,

Enevoar o mundo na boa bruma
que se assemelha ao soprar do vento;
diferenciar cada um dos mil arquejos,
fantasmas com a corrente do tormento.

Nas palavras, pouco a pouco, construir
etéreo e diáfano refúgio,
de onde se veja o mundo com clareza
e onde se possa abrigar contra o Dilúvio.

Aprisionar emoções, momentos, não é esse o meu intento,
a intenção do poeta é a expansão;
Permitir, humilde, as sensações ocultas em suas palavras,
como uma música, viver em eterno movimento,
graça estrelar e, principalmente, transmutação.

  Sei que um escritor não deve comentar muito sobre seus próprios textos com os leitores, para que haja várias interpretações diferentes sobre a mesma obra, mas tenho que dizer que da criação de "Sopro de água" até "Bela Balada", evoluí bastante literariamente. Do nascimento daquele a esse transcorreram dois anos. No primeiro, o eu-lírico tem na Poesia o alívio e a retomada de suas dores, e entram em foco as contradições em sua alma; no segundo, o trabalho do poeta é abordado de forma mais completa, mais vibrante e ao final refuta-se a idéia de que aquele apenas cristaliza emoções sob a forma de palavras para conservá-las eternamente.
  Se alguém encontrar em minhas palavras outros sentidos, deixe um comentário e eu terei prazer em ler e responder (talvez até em outro post desse blog).



  Carpe diem!

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Lutando com palavras...

  Há pouco tempo assisti ao documentário "Encontro marcado com o cinema", de Fernando Sabino e David Neves. É um exemplo perfeito de diálogo entre diversas artes: o cinema e a literatura, com um pouco de música, entremeados de política.
  O filme começa com Manuel Bandeira, "O Habitante de Pasárgada". Essa parte é toda em preto e branco, e o poeta aparece solitário, primeiramente andando nas ruas, ao som de uma melancólica música clássica, e depois em sua despojada casa. O primeiro poema que o bardo recita é "Testamento", em que o poeta coloca um tom de lamento e fuga, mas em uma linguagem simples, o que mostra bem o Manuel modernista de alma romântica, lado seu que ele próprio reconhece em verso em outro texto. Mas Bandeira não se resume a isso, como vários outros versos evidenciam, embora seu desejo de fugir seja parte importante de sua lírica.
   Outro momento que me impressionou muito foi "O Fazendeiro do Ar", protagonizado por Drummond, o bruxo, cuja Poesia foi tão diversa e encantadora, que é difícil acreditar que a Musa possa ter sido tão generosa com um homem. O escritor, tímido e avesso a entrevistas, se abre de uma forma surpreendente, falando sobre vários assuntos importantes em sua vida. Além disso, não posso deixar de mencionar os dialógos entre um menino e a estátua de Drummond na praia de Copacabana, o que foi retirado de uma outra produção, "O menino e o poeta", na qual vários versos do bruxo são recitados por ele próprio.
  Entretanto, apesar de o bruxo e o bardo serem umas das minhas maiores influências poéticas, a minha parte favorita do filme foi aquela sobre Vinicius de Moraes, "Poesia, Música e Amor". Vinicius soube abraçar belamente a Poesia e a Música, artes irmãs, que nos tempos antigos eram uma só na voz dos aedos, que tocavam cítara e simultaneamente cantavam versos criados na hora. O que mais me impressionou foi a informação de que ele, aos seis anos, produziu seu primeiro poema, de estilo romântico e linguagem muito formal. Os versos foram dedicados a uma menina de sete anos, e o poetinha diz que desde o início se sentiu atraído por mulheres mais velhas.
   É claro que o documentário não se resume a esses três grandes artistas: há ainda "O Curso do Poeta" (João Cabral de Melo Neto), "Um Contador de Histórias" (Érico Veríssimo), "Na Casa de Rio Vermelho" (Jorge Amado), "Veredas de Minas" (João Guimarães Rosa),"Em tempo de Nava" (Pedro Nava), "Romancista ao Norte" (José Américo de Almeida), "O Escritor na Vida Pública" (Afonso Arinos de Melo Franco) e um extra, "Encontro marcado com Fernando Sabino" (dirigido por Bernardo Sabino, que não está disponível na Internet infelizmente).
    Certamente esse filme deve ser assistido por todos os amantes de literatura e de cinema. Ele nos aproxima muito de artistas ilustres que a minha geração não teve o prazer de conhecer pessoalmente, mas que são imortais em suas obras. Manuel Bandeira disse, em um poema, que duas vezes se morre; uma na carne, e outra na memória, no espírito. Mas isso não se aplica nem ao próprio poeta nem a todos os outros que apareceram nesse documentário.