terça-feira, 20 de abril de 2010

Dons

   A poeta, depois de sua última postagem, ficou desanimada. Ela olhava pelas janelas de sua casa, e via a chuva, que mesmo diminuindo, a fazia lembrar das tragédias ocorridas no estado do Rio de Janeiro. E ao abrir as janelas virtuais, imagens e textos traziam até ela o sofrimento das vítimas de forma mais concreta e dolorosa.
   Sim, eu sei que muitos (inclusive eu) doaram colchonetes, material de higiene, dinheiro e alimentos não perecíveis aos que foram atingidos pela força das chuvas. Certamente isso é admirável. Mas não devemos esquecer que, embora a tempestade tenha passado, os problemas de infra-estrutura do Rio de Janeiro, Niterói, São Gonçalo, e de outras cidades (serranas) persistem. E que, caso esse fenômeno atmosférico se repita, certamente a tragédia se repetirá.
   A memória do povo é curta, como eu disse no último poema que coloquei aqui. E é por isso que eu venho lembrar a vocês das chuvas, agora que os gigantes da mídia se cansaram do assunto.
    E como sei que imagens têm um grande impacto, deixo aqui o link de um vídeo, além de um poema meu.

     Dons

      Não desejo possuir o Espelho da Eternidade,
      para ver, do Futuro, os fúlgidos lampejos de Luz, clarões;
      o Futuro é névoa, névoa incerta, e só veria névoa
      se tivesse esse espelho; o Futuro habita em nossos corações.


      O Futuro é sonho; é embrião do Presente,
      embora este tenha de ser constante;
      se alterarmos o Presente por um instante,
      o Futuro será outro.


     E o Passado, que foi Presente um dia,
     às vezes torna-se tão turvo quanto o Amanhã;
     o Passado tem mistérios (quem diria!),
     segredos que não desvendamos no certo tempo.


     O Tempo passa, e em nossas Almas,
     são outros nossos terríveis tormentos;
     o Tempo é transição, e transforma
     nossos fantasmas e sofrimentos.
    
     Por isso, disse que o Futuro
     é sonho e embrião;
     o Futuro pulsa em nós, ávido,
     e reside em nosso Coração.


      Não quero o dom da contemplação;
      observar o que virá é simplório,
      e tudo, em verdade, ideais e mundos,
      no Tempo vive; tudo é transitório.


      Quero o dom supremo de transformar
      a realidade de toda a gente;
      quero transmutar o que ocorre agora,
      o Mundo de quem respira, ri, chora e sente!

     
      O link do vídeo é: http://www.youtube.com/watch?v=PeduZpj_Zsc. É um relato emocionante das chuvas na cidade do Rio de Janeiro.

terça-feira, 6 de abril de 2010

Rio, a lamentável Veneza brasileira II

   Deixo aqui o link com as listas dos postos de coleta de doações instituídos pela prefeitura:
http://odia.terra.com.br/portal/rio/html/2010/4/saiba_como_ajudar_os_desabrigados_das_chuvas_no_rio_73593.html
   A prefeitura pede que sejam doados colchonetes, roupas, alimentos não-perecíveis e água potável para os desabrigados pelas chuvas do Rio. Contribua!

Rio, a lamentável Veneza brasileira

   A chuva está caindo por toda a cidade, e hoje ela será o assunto do meu blog. Entretanto, não falarei do tema da forma poética tradicional, cantando como a chuva induz aos devaneios, lembranças e sonhos, tampouco escrevendo sobre a beleza da manhã fria e chuvosa...
   Não, a chuva no Rio de Janeiro é um tema social. Mais uma vez, essa cidade caótica transformou-se na Veneza brasileira. Que o bardo Manuel Bandeira me perdoe por chamar o Rio, e não o Recife, por tal título, mas é a verdade. Basta olhar para o estado lamentável da Cidade Maravilhosa: muitas ruas viraram rios, com direito a sacos de lixo boiando, e vários deslizamentos de terra ocorreram, deixando muitos mortos e desabrigados... Infelizmente, comparar o Rio à Veneza assume conotações negativas...
   A verdade é que não só o Rio de Janeiro, mas também Niterói e outros municípios metropolitanos e serranos enfrentam essa situação. E é ingenuidade culpar a atmosfera por esses problemas; a verdadeira culpa é da falta de infra-estrutura dessas cidades. Afinal, por que não projetar ruas mais altas? Por que não evitar que o lixo se acumule em bueiros? E por que não evitar o desmatamento das encostas, que, desprovidas de sua vegetação original, absorvem menos a água, a qual ganha força e arrasta grandes pedaços de terra, casas e pessoas morros abaixo? Por que não impedir a ocupação das encostas, para evitar muitos desaparecimentos e mortes?
    As respostas são óbvias. Projetar ruas mais altas e cuidar mais do saneamento básico geraria um grande custo para o governo. E a questão das encostas é ainda mais delicada: muitas pessoas de baixa renda constroem ali suas casas, mesmo com o perigo dos deslizamentos, porque não conseguem imóveis baratos em lugares perto de seus trabalhos. Reassentar esses cidadãos daria muito trabalho, e faria que muitos deixassem de votar nos políticos responsáveis por isso, porque preferem ficar nas encostas. No entanto, não é muito mais alto o custo de dezenas (ou centenas) de vidas humanas perdidas? Não é esse custo que deve ser a prioridade para o governo?
   Como se não bastasse, enquanto o Estado do Rio de Janeiro enfrenta esse dia infernal, o nosso amado governador Sérgio Cabral faz propagandas sobre o PAC.  Fez muito bem, Cabral; por que um governante se preocuparia com o bem-estar de seu povo em uma situação oficial de estado de calamidade pública?
   Para melhor marcar a minha indignação, deixo aqui um poema, retirado do meu livro "Coração in Vitro".  Continuarei empregando todos os meus esforços para que a situação descrita nestes versos acabe o quanto antes.

Ditadura velada


Vivemos ignorantemente felizes,
com o sol a iluminar a vitrine das lojas,
e o pobre mendigo a dormir na rua, calmamente.
Entretanto, há um mundo maior
que o da vizinhança, dos mercados.
(Nós somos o mercado,
que sofre e que nunca é pago,
pois nós pagamos).
Pouca gente sabe, e "gente" aqui é o povo,
a quem tudo se destina e que nada recebe,
pouca gente sabe que somos iludidos
pelos empresários, pelos senadores,
pelos vendedores, pelos deputados.
Somos enganados a ponto de achar
que vivemos numa democracia.
Qual! A democracia cabe aos governantes,
a nós cabe a obediência.
Temos nossas mãos atadas,
somos mudos, não surdos, porém
nada fazemos para acabar com isso.
Nossa memória é curta,
não somos explosivos.
Somos subservientes,
totalmente passivos.
Vivemos numa ditadura velada,
muito mais difícil de ser vencida do que a explícita (a antiga).

segunda-feira, 22 de março de 2010

Poder, Política e Poesia

       É necessário que o poeta seja engajado politicamente. Ele não só é membro da sociedade, como também reconhece o fato de que Poesia na Política. Esta é um jogo de poder, permeado de ideais, paixões, interesses e artíficios,  e decide muitas vidas. A Política está intrinsicamente ligada à Humanidade, assim como a Arte.
      Além disso, é preciso lembrar a mais relevante semelhança entre essas duas sedutoras ninfas: ambas são instrumentos poderosos, que tanto podem significar opressão ou liberdade.  A Arte pode tanto difundir idéias como amor e igualdade social, como pode ser usada para convencer as massas de que o conformismo deve reinar, uma vez que a corrupção é inerente ao ser humano. A Política pode levar boas condições de vida à toda a sociedade, ou pode ser a ferramenta para manter o povo na pobreza e na ignorância. Cabe ao poeta e ao político utilizarem seus meios para propóstitos dignos.
   Venho aqui cumprir a minha obrigação, que me foi lembrada especialmente por ocasião da emenda Ibsen Pinheiro. Tal emenda propõe severa redução dos royalties recebidos pelos municípios e estados produtores de petróleo. O próprio Rio de Janeiro ficaria com sete bilhões a menos na sua receita, o que prejudicaria todo o Brasil. Esse estado é o segundo mais importante economicamente do país; suas indústrias e serviços empregam, direta e indiretamente, batalhões de pessoas. Com sete bilhões a menos, a economia fluminense não poderia se sustentar, como diversos especialistas já afirmaram, e isso se refletiria em uma grande crise nacional, cujo pior produto seria uma catastrófica onda de desemprego.
    Esse é o argumento mais importante socialmente, mas ainda há outros. Espero que o senado reflita sobre todas as perdas que aprovar a emenda Ibsen acarretará.
    Entretanto, não podemos só "esperar" que o governo perceba o absurdo dessa emenda. Temos de nos mobilizar para que isso aconteça, inclusive usando a Arte e a mídia. Por isso, deixo aqui um poema meu sobre Política:

Messias

Esperamos, contemplando o Universo,
decifrando, dos Planetas, os mistérios,
em nossos mundos, estáticos.
Esperamos que os Céus se abram,
que nossas Estrelas se renovem,
que venha a nós um Ser Iluminado.


O grande segredo não é olhar para o Infinito
não sejamos tão contemplativos
em relação a tudo.
Não aceitemos o que nos desagrada,
não honremos quem nos desacata,
mudemos o Mundo!


Não endeusemos um só indíviduo,
sejamos nós essas salvadoras divindades,
sejamos sagrados.
Em verdade, somos nós, o povo,
essas poderosas deidades.


Não se conformem! Vão às ruas!
Vamos todos juntos à luta!
À Justiça demos o sangue, o pranto e o coração!
E, mais tarde, com Glória, seremos recordados,
como heróis seremos relembrados,
pois todo o Homem é um ser movido à paixão!

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Um pouco de filosofia

Muitas pessoas discutem sobre a existência de um lugar ideal. Será que o Céu existe mesmo? Será que lá há lugar para nós? Aqui eu exponho a minha visão sobre o assunto, no poema "Cá dentro".

Cá dentro


O tempo passa lá fora;
não sei como, pois não estou lá.
E nem sei mesmo como passa o tempo cá dentro,
se anda célere ou devagar.


E o tempo cá dentro não existe,
o que existe é uma perene conversa; (que harmonia!)
pensamentos leves, emoções profundas,
cruzam minha alma com mui maestria!


O tempo é banal e apenas nasceu
da necessidade humana de se recordar.
Pois os anos passam, e ainda não sei
se o tempo cá dentro anda célere ou devagar.


Cá dentro só há luz,
e paz, e gosto, e prazer, e fascinação!
Contamos o tempo pelo soprar do vento,
ou pela batida dum coração!


Cá dentro, mergulhamos (pelo menos, eu mergulho)
num mar sem ondas, verde e cristalino!
Uma imensidão sem fim, verdadeiramente pura!
Pura como o olhar mais límpido.


Cá dentro é o lugar ideal
para se divertir e se deleitar.
E ninguém sabe a quantas está o tempo,
se anda célere ou devagar.


Por isso, criamos cá dentro o nosso tempo!
Reino da paz, gosto, prazer e fascinação!
Contamos o tempo pelo soprar do vento,
ou pela batida dum coração?

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

Sombra libertina

A quarta-feira de cinzas está aqui. Mas por que se concentrar na tristeza e na saudade deixadas pelo fim do Carnaval? Agora que a festa da carne acabou, é hora de voltar para o mundo real e tentar mudá-lo, melhorá-lo. É essencial ter esperança na capacidade humana de transformar o meio. Com esse espírito, coloco aqui alguns versos:

Sombra libertina

Ao longe, na rua deserta
uma sombra no chão se firma
o Sol, o Céu e a Terra
sorriem para a tal libertina
que dança no asfalto, sem preocupação
os movimentos são poesia
a mais pura do coração
e seu dono, que viu que o Sol
para a sua sombra sorria,
pôs em movimento novamente
a querida sombra libertina
e a Manhã suspirava, e consigo dizia:
A libertinagem é o raiar
de um novo dia.
Deus abençoe essa sombra libertina!

Mas os homens que eram conservadores
e não viam a beleza da vida
(pois em suas vidas não havia amores)
censuravam a dançarina.
Achavam que a sombra
só por ter alegria
afrontava o universo róseo
que alguém um dia construíra.
E o Sol, o Céu e a Terra
com a Manhã concordavam, que dizia:
Deus abençoe essa sombra libertina!

E a sombra e o seu dono
não pararam de dançar
no asfalto das ruas às doces melodias.
E as Árvores, o Campo, o Verde
concordavam com a Manhã, que dizia:
A sociedade precisa
de mais sombras libertinas!